sábado, 13 de novembro de 2010

escrito V

dor.saudade

Sou dentro de mim, na imensa escuridão que me engole, na melancolia que me engole, na solidão que me engole, no luto que me engole. E sou tanto por dentro. E nada sou sem ti.

A noite faz-se sem cor. A rua não tem matiz. O vento, lava faces de quem se deixou arrumar no tempo, na rua, na calçada. As caras cinzentas: são blocos. Os corpos ordenados na rua, que se passeiam geometricamente, em padrões, em rotinas. Será que vens? Já não me lembro se era esta a hora marcada. As primeiras linhas de chuva arrumam-me a face, desordenada por não te ver. Será que me lembras? Eu lembro-te, neste mesmo banco, onde morrem as camélias, no chão. Não há cor no céu, não há cor na rua, somos todos a preto e branco, hoje, esta noite, hoje, na rua. O António passa por mim, acena-me com a cara. A chuva. Pergunta-me como estou, como estou por não estares. Espero-te no banco, onde morrem as camélias, onde morro contigo, na tua ausência. Pergunta-me se já foi o teu enterro. A chuva dilui o negro das minhas lágrimas. Será que vens? Quero tanto que voltes. Ainda me lembras? Quero tanto acreditar que sim, que me aguardas na eternidade. Não lhe respondo, choro-te. Quero tanto estar contigo, abraçar-te. Choro-te tanto. O António. As pessoas que trocam palavras soltas em torno de mim. Agarram-me o corpo. Os comprimidos: a ponte que nos separa. Lembro-te tanto. A vizinha do segundo direito, chora. Ouço as sirenes. Está tudo tão negro, sem cor. Os comprimidos. Esperas por mim?


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