domingo, 21 de novembro de 2010

escrito XIII

homem ninguém
[a vida procuro-a nos que me fazem, por ser também, um pouco neles. somos.]


Homem, ninguém te vê inteiro, pelo que és, pelo que crês. Um homem incerto, diz quem julga que te vê, quem não te soube valer. Em gestos estudados, os olhos: verdes, frios, gelados, negados; e olham-te, tocam-te e amassam-te, e tu sem nada a dizer. Apenas na mão, só, doce negação do prazer dos outros. Doce por ser, oportunidade de ter também, ódio: dor e ódio da dor, em dor, em ódio: em ti - para chorares com algo na mão e dizeres, eu tenho isto em mim. Eu tenho isto em mim! Gritar, eu vou morrer por ter, vontade em mim! E te evadires de ti. E não te lembrares de ti. Apenas o amargo da dor, doce por não te veres... fácil para viver: comprimido das horas vagas. E esse ódio a quem o vais servir? Bem no fundo, de nada te vai valer.
Desistes. Gritas, amanhã morri, a voz dessa doença, o teu doce desistir: por te teres em todos, sem te teres em ti. Grita, grita, grita essa voz que se prende, essa palavra que se amarra, e acorda a vontade, e expulsa a tontura que te vai na alma.
Homem, ninguém nos vê dentro de nós.



desenha-se a palavra nos lábios,
expressão imediata da reacção, palavra,
afiguração da imagem, do secreto:
o que está para além da fala, pensamento bruto,
segredo que percorre o cérebro, segredo
que se revela, que existe
por haver também, outro alguém, outra palavra,
um Gil Eanes que além cabo Bojador,
vê mundos a descoberto, vê
em mãos de descobridor, palavras de alguém
que se revela...
palavras de alguém que se revela.

[ escrevo-te: escrevo-nos.]

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